A trilogia de estreia de R. F. Kuang chega ao fim com o seu terceiro volume, A deusa ardente. Antevendo um pouco a minha opinião sobre a trilogia como um todo, estava à espera de mais. Mas já lá iremos. Primeiramente, tenho que falar sobre o livro em si.
Atenção: este artigo pode conter spoilers.
Não se esqueçam de conferir os outros volumes da trilogia:
Sobre a autora
Opinião
Eu sou a força da criação. Sou o fim e o começo. O mundo é uma pintura e eu seguro o pincel. Sou um deus
Após a traição de Nezha, Rin não só perdeu a sua mão, como perdeu a sua unidade de comando - os Cike. Juntamente com Kitay e Venka, Rin volta a sua atenção para o Sul, para a sua casa, prometendo libertá-los dos resquícios da ocupação mugenesa e liderá-los na sua vingança contra o novo regime imposto pelo Norte, a República (liderada pelos Yin).
O volume anterior já demonstrava algumas inconsistências narrativas que foram mais ou menos suavizadas na segunda metade do livro. No entanto, A deusa ardente é só problemas do início ao fim. Um dos problemas é a reutilização de conflitos passados que já haviam sido resolvidos nos volumes anteriores, como por exemplo o espectro de Altan. Esta reutilização é imediatamente evidente no início, onde Kuang repete a mesma fórmula, deixando-nos perdidos pois o final d'A república do dragão prometia algo mais explosivo neste terceiro livro. Para além disso, a repetição de antigos conflitos (volto a frisar, já resolvidos) faz com que as personagens voltem à estaca zero e todo o seu desenvolvimento seja desfeito. Consequentemente, a história simplesmente dá voltas e voltas, sem nunca sair do mesmo lugar. Outro problema que assola o livro é o desenvolvimento de certas personagens e tramas - sim, refiro-me ao Trio e aos xamãs - que depois acabam por ser descartados dois/três capítulos a seguir de uma forma que, a meu ver, não fez qualquer sentido. Para quê desenvolver uma personagem ou uma trama, se esta não vai ser devidamente utilizada ou ter de facto algum impacto na história?
Tudo isto apenas evidencia uma falta de cuidado ao construir a trama para este volume, levando-me a questionar se a autora realmente tinha um plano para estas personagens e para a história. No decorrer da minha leitura, eu só conseguia pensar no quanto tudo parecia caótico, sem nenhuma direção clara. Naturalmente, a frustração foi acumulando, chegando ao ponto em que sequer pensar em concluir o livro me cansava. Possivelmente, deveria ter pousado o livro e retomado a leitura numa outra altura, quando a minha mente já estivesse mais focada. Mas a teimosia serve para o bem e para o mal e, portanto, tinha que concluir o livro.
As pessoas são atraídas pelo poder, querida. Não conseguem evitar. O poder seduz. Exerce-o, faz dele um espetáculo e eles seguir-te-ão
Nem tudo é mau. Kuang aborda algumas questões relativamente interessantes, tais como o impacto e as consequências de uma guerra civil prolongada e os movimentos de massas em contextos de violência. Todavia, esses acabam por ser os únicos pontos aproveitáveis do livro, sendo ofuscados por tudo o que já mencionei.
Falando da trilogia como um todo, como já referi, estava à espera de mais. A narrativa de Kuang é interessante e traz à baila algumas discussões pertinentes - especialmente tendo em conta o contexto atual. Contudo, e indo na contracorrente, não considero que a sua abordagem seja particularmente extraordinária. Desconsiderando todos os seus problemas, nenhum dos livros que compõem esta trilogia me enche de facto as medidas, deixando sempre a sensação de que falta ali algum tempero para que o prato se tornasse verdadeiramente fantástico.
⭐⭐
2/5
Até à próxima!
Ellis
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