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A guerra das papoilas (A guerra das papoilas #1) | Opinião #302

 Saudações caros leitores!

    R. F. Kuang é um dos nomes mais sonantes atualmente no mundo dos livros. Com cinco livros publicados e um sexto a caminho, a autora tem vindo a cimentar a sua popularidade com cada livro escrito, dedicando-se a temas sociais e políticos controversos e explorando as nuances que compõem a sociedade humana. A guerra das papoilas foi o seu primeiro livro publicado e é também o primeiro livro que inicia a trilogia homónima.

    Não se esqueçam de conferir os próximos volumes da trilogia:

Sobre a autora

    Rebecca F. Kuang é escritora, tradutora de mandarim e bolseira da Marshall Scholarship. É mestre em Filosofia, nas áreas de Estudos Chineses e de Estudos Chineses Contemporâneos, respetivamente por Cambridge e Oxford, em Inglaterra. Venceu o Hugo Award e o Astounding Award for Best New Writer, bem como os prémios Crawford e Compton Crook para livro de estreia, A Guerra das Papoilas — o primeiro livro de uma trilogia já em publicação pela Desrotina —, além de ter sido nomeada para os Nebula, Locus e World Fantasy.

Sinopse

    Quando Rin passou no Keju — o teste para encontrar os jovens com mais talento do Império — todos se admiraram, até a própria Rin, que percebeu que estava livre da servidão e desespero da sua existência. O facto de ter entrado em Sinegard — a escola militar de elite de Nikan — foi ainda mais surpreendente.

    Mas as surpresas nem sempre são boas, especialmente quando se é uma órfã de pele escura com raízes camponesas pobres de quem veio de territórios do Sul. Perseguida por rivais, Rin vai descobrindo que detém um poder letal e sobrenatural — uma aptidão quase mística da arte do xamanismo. Explorando o seu poder com a ajuda de um professor aparentemente louco, Rin descobre que deuses considerados mortos estão, afinal, bastante vivos; e que dominar os seus poderes significa bem mais do que sobreviver à escola em Sinegard.

    Mesmo com o Império Nikara em paz, a Federação de Mugen espreita, perigosa, do outro lado do mar, antecipando uma nova Guerra das Papoilas. Rin, aprendendo com os seus poderes, teme que, para vencer uma guerra, possa ter de perder a sua humanidade. Se é que já não é demasiado tarde...

Opinião

O poder dita a aceitabilidade

    A guerra das papoilas passa-se num mundo asiático fictício, mas com grandes inspirações na História chinesa do séc. XIX e do séc. XX - nomeadamente, as Guerras do Ópio e a Segunda Guerra Mundial. O livro centra-se à volta de Rin, a nossa protagonista, uma órfã de pele escura, proveniente do sul profundo, que procura escapar a uma vida de pobreza e a um casamento arranjado ao candidatar-se ao Keju - um exame nacional, ao qual todos se podem candidatar (pelo menos, em teoria). Contra todas as expectativas, Rin classifica-se como a melhor aluna e ingressa na prestigiada Sinegard, uma academia militar de onde saem os próximos soldados e governantes do país. A primeira parte do livro é inteiramente dedicada à vida académica de Rin, sendo que é somente na segunda parte que temos o despoletar da guerra que figura no título.

    Como posso descrever o livro? Brutal; de maneiras que não estava à espera. O início do livro é marcado pelos lugares-comuns do género fantástico, porém - umas cem páginas depois - R. F. Kuang começa a subverter os clichés e, consequentemente, as nossas expectativas. A guerra das papoilas não é propriamente uma leitura fácil, mais por conta dos temas que trata e que exigem um pouco de reflexão e não tanto pela lista de gatilhos que outras críticas poderão fornecer. Só este primeiro livro trata de temas como a misoginia, exclusão social, drogas, abusos de poder, colonialismo, entre outros. No entanto, as principais pautas são o poder e a guerra, sendo trabalhadas de forma gradual até à terceira parte: a partir daí, é só uma sucessão catastrófica de acontecimentos que esticam ainda mais os princípios das personagens (especialmente da protagonista), ao ponto de muitos simplesmente estilhaçarem. Possivelmente indo na contracorrente, não creio que estes temas tenham sido particularmente bem desenvolvidos. Comparando com um outro livro seu, Babel toca, mas coisa menos coisa, nos mesmos assuntos, contudo fá-lo de uma maneira mais subtil, permitindo ao leitor retirar as suas próprias conclusões daquilo que lê. Naturalmente que uma pessoa pode (e deve) retirar as suas próprias conclusões daquilo que lê, todavia senti que neste livro Kuang apresenta todos estes assuntos de uma maneira mais escancarada; como se estivesse a apontar para todas coisas consideradas ou vistas como absolutamente más. É certo que este é ainda o primeiro livro de uma trilogia, portanto fico expectante que os próximos melhorem um pouco este aspeto que mencionei.

O objetivo de cada lição não precisa de ser destruir. Ensinei-te Conhecimento para te ajudar a encontrar o equilíbrio. Ensinei-te para que percebesses que o Universo é mais do que aquilo que vemos. Não te ensinei para o poderes transformar numa arma

    Uma das coisas que Kuang subverte desde logo são as suas personagens. Em A guerra das papoilas não temos personagens santinhas ou fundamentalmente boas. Aliás, através de Rin, a autora leva-nos a questionar o que é ser uma pessoa boa ou pessoa má, sobretudo em ambientes altamente competitivos ou em situações de guerra. Rin não é a típica heroína a que estaríamos à espera. Na verdade, ainda não sei exatamente como classificar Rin. Rin é uma miúda que não tem nada e quando começa a ter um vislumbre de algo só seu, ela agarra-se a isso com unhas e dentes e não deslarga - não sem uma luta. O livro inteiro é contado sob a sua perspectiva e vamos acompanhando ao degradamento da sua mente e da sua moral conforme a personagem vai passando os diferentes acontecimentos do livro - o preconceito social e racial em Sinegard; a brutalidade da guerra; etc. Rin é uma personagem interessante, no entanto houve momentos em que simplesmente me deu vontade de abaná-la para ver se os neurónios retomavam o seu lugar. Ainda assim, é de admirar a sua resiliência, sobretudo quando se vai travando dentro de si um conflito interno entre o seu lado mais racional e o seu lado mais sombrio.

    As demais personagens são igualmente complexas e interessantes. Junto de Rin, as restantes personagem cativam a nossa atenção por vários motivos. Jiang é um mistério e um contrassenso ambulante; Altan, que à primeira vista parece ser um menino de ouro da academia, logo se revela ser uma personagem totalmente diferente do que esperávamos; Kitay, o mais racional de todos e com os pés bem assentes no chão; Nezha, que passa de um rival para um companheiro de armas; os Cike, todos eles igualmente estranhos, perigosos, mas de alguma forma relacionáveis. E, claro, a Imperatriz; uma personagem ausente-presente, que suscita suspeitas e cautela.

A guerra não determina quem está certo. A guerra determina quem sobra

    A guerra das papoilas é deveras um livro interessante, todavia que talvez poderia ter oferecido mais, sobretudo no que toca às personagens. Houve personagens a entrarem e a saírem de cena demasiado rápido, sem que nos fosse dada a hipótese de pelo menos tentar descortiná-las. Não obstante, gostei do livro e tenho já a sequela na mão para ler.

⭐⭐⭐

3.5/5

Até à próxima!

Ellis

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